segunda-feira, 23 de julho de 2018

LIBERDADE: A HISTÓRIA DO BAIRRO

Liberdade: A HISTÓRIA DO BAIRRO


LIBERDADE: A origem do bairro
5 de maio de 2015
Antes de se tornar o principal reduto da comunidade oriental na cidade, o bairro paulistano da Liberdade era chamado de Distrito Sul da Sé, pois era parte do Distrito da Sé, que fora estruturado em dois distritos, o do Sul e o do Norte, por ato da Câmara Municipal de 14 de março de 1833. O Sul da Sé teve suas divisas demarcadas em 1863 e alteradas em 1872. Por fim, em 20 de dezembro de 1905, uma lei criou o Distrito da Liberdade. Em suas origens, no século 17, a Liberdade compreendia terras situadas ao longo do caminho que ligava o centro da cidade à Zona Sul, ao município de Santo Amaro. Esse caminho, conhecido como “caminho de Ibirapuera” ou “caminho de carro para Santo Amaro”, saia do centro em direção ao sul pelo traçado atual da avenida Liberdade e da rua Vergueiro. Há registros de que esse caminho também tenha sido conhecido como “estrada nova para Santos”. Nessa região, havia muitas chácaras, algumas de grande extensão territorial, onde era cultivado especialmente chá. Da divisão dessas chácaras nasceu o bairro da Liberdade. O bairro abrigou, no século 19, o largo do Pelourinho, onde eram amarrados escravos fugitivos. Alí também ficava localizado o Largo da Forca, que recebeu essa denominação por ser local de execuções, entre as quais ficaram conhecidas as dos soldados Fransciso José das Chagas, o Chaguinhas, e Joaquim José Cotindiba, ocorridas em 1821. O enforcamento dos dois soldados, condenados por reclamar do soldo pago pela Coroa portuguessa, marcou a cidade de tal modo que foi erguida no local a capela de Santa Cruz dos Enforcados, hoje Igreja de Santa Cruz dos Enforcados. Com a abolição da pena de morte do Brasil, o Largo da Forca passou a chamar-se Largo da Liberdade.
No século 19, o centro de São Paulo foi ligado a Santo Amaro pelas linhas de bonde, cujos trilhos foram construídos no traçado do “caminho de carro”. Uma parte desse caminho viria a ser a rua Domingos de Moraes. Na virada do século 19 para o século 20, a Liberdade começa a sofrer um forte processo de urbanização com alargamento de ruas, desapropriações de terras e imóveis, construções de praças e largos e calçamento de ruas com paralelepípedos.Nessa época, a Liberdade era um bairro residencial habitado por imigrantes portugueses e italianos que, com o passar dos anos, deixariam ao bairro em direção a outras partes da cidade. Os traços orientais de prédios e residências só começaram a aparecer após a chegada dos primeiros imigrantes japoneses ao Brasil, em 1908, Origem do nome A Liberdade era considerada uma área periférica até o século 19, quando era conhecida como Bairro da Pólvora, graças à Casa de Pólvora, construída em 1754 no atual Largo de mesmo nome. Quem hoje passa pela Praça da Liberdade talvez não saiba que o local foi o palco sombrio de execuções. Conhecida na época colonial como Largo da Forca, recebeu esse nome devido à forca transferida da Rua Tabatinguera em 1604. No largo houve execuções de criminosos e escravos até 1891, quando recebeu o nome de Liberdade. “As versões mais aceitas sobre a origem dessa denominação devem-se às punições ocorridas no século 19. Nessa época, as pessoas aguardavam a execução na Igreja dos Aflitos. Após a pena, os corpos eram velados na Igreja dos Enforcados. Na Igreja das Almas era feita uma missa aos condenados”, explica Angelina Obata, pesquisadora do Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil. O bairro da Liberdade recebeu a denominação de Largo da Forca porque entre as várias localidades de São Paulo, foi escolhido para abrigar uma forca destinada à execução da pena de morte. Mas antes de lá ser construída, o instrumento do suplício dos condenados rodou por várias regiões da capital, que não falaremos a respeito por ser desnecessário a esta pesquisa. Uma das cenas mais cruéis foi perpetrada no Largo da Forca (atual Largo da Liberdade). O Governo Provisório tentou abafar um levante militar de soldados que reclamaram do valor de seus soldos à Coroa portuguesa. Duas execuções causaram grande clamor popular, as dos soldados Fransciso José das Chagas, o Chaguinhas, e Joaquim José Cotindiba, ocorridas em 1821. O enforcamento dos dois soldados, condenados por reclamar do soldo pago pela Coroa portuguesa. Cotindiba morreu rápido, mas o Chaguinhas não. As cordas que o enforcariam arrebentaram várias vezes. O público pedia clemência e gritava: “Liberdade, Liberdade!” Como o ato não se consumava, morreu a pauladas. Daí por diante, passou Chaguinhas a ser herói. Esta execução marcou a cidade de tal modo que foi erguida no local a capela de Santa Cruz dos Enforcados, hoje Igreja de Santa Cruz dos Enforcados. Em lembrança a Chaguinhas, manteve-se a prática de acender velas pelas almas do purgatório Com a abolição da pena de morte do Brasil, o Largo da Forca passou a chamar-se Largo da Liberdade.
A Chegada do Kasato Maru
Em 18 de junho de 1908, chega ao porto de Santos o navio Kasato Maru, trazendo os primeiros 782 imigrantes ao Brasil. Deixaram o porto de Kobe em 28 de abril para “fazer a América”, o que significava trabalhar nas lavouras de café no interior do Estado. Muitos não se acostumaram com a rotina “escravocrata” das fazendas, e acabaram migrando para a capital de São Paulo. Em 1912, muitos imigrantes japoneses já estavam instalados em pensões na rua Conde de Sarzedas. Um dos motivos de procurarem essa rua é que quase todos os imóveis tinham porões, e os aluguéis dos quartos no subsolo eram incrivelmente baratos. Nesses quartos moravam apenas grupos de pessoas. Para aqueles imigrantes, aquele cantinho da cidade de São Paulo significava esperança por dias melhores. Uma das explicações para a escolha deste bairro é que ali os aluguéis eram baratos, e estavam próximos de feiras livres e do Mercado da Cantareira- a esmagadora maioria destes imigrantes eram lavradores em seu país. Nas décadas seguintes, dezenas de navios abarrotados de japoneses chegaram em Santos, e as ruas Tabatinguera e adjacentes começaram a ser habitadas por estes imigrantes.Já nessa época começaram a surgir as atividades comerciais: uma hospedaria, um empório, uma casa que fabricava tofu (queijo de soja), outra que fabricava manju (doce japonês) e também firmas agenciadoras de empregos, formando assim a “rua dos japoneses”. Na década de 50, outros imigrantes chineses e coreanos chegaram para engrossar a população do bairro, que já adquirira muitas características orientais. O bairro conheceu então as lanternas suzurano, os jardins japoneses e as festas típicas.
A influência oriental cresceu tanto que, em 1969, foi anunciado um plano de reurbanização do bairro dentro do processo de expansão da Linha 1-Azul do Metrô. Em 1974, aconteceu a criação do “Bairro Oriental”, com ruas e praças do bairro inteiramente decoradas com motivos orientais, adquirindo características de uma autêntica cidade japonesa. Por fim, em fevereiro de 1975, foram inauguradas as estações Liberdade e São Joaquim do Metrô.
Primeiros comércios e escolas
No ano de 1914 foi fundado o Hotel Ueji, pioneiro dos hotéis japoneses em São Paulo, e em 1915 foi fundada a Taisho Shogakko (Escola Primária Taisho), que ajudou na educação dos filhos de japoneses, então em número aproximado de 300 pessoas. Os japoneses trabalhavam em mais de 60 atividades, mas quase todos os estabelecimentos funcionavam para atender a coletividade nipo-brasileira. Em 12 de outubro de 1946 foi fundado o jornal São Paulo Shimbun, o primeiro no pós-guerra entre os nikkeis. Em 1º de janeiro de 1947 foi a vez do Jornal Paulista. No mesmo ano foi inaugurada a Livraria Sol (Taiyodo), ainda hoje presente no bairro da Liberdade, que passa a importar livros japoneses através dos Estados Unidos. A agência de viagens Tunibra inicia as atividades no mesmo ano. Uma orquestra formada pelo professor Masahiko Maruyama faz o primeiro concerto do pós-guerra em março de 1947, no auditório do Centro do Professorado Paulista, na Avenida Liberdade. Em 23 de julho de 1953, Yoshikazu Tanaka inaugurou na rua Galvão Bueno um prédio de 5 andares, com salão, restaurante, hotel e uma grande sala de projeção no andar térreo, para 1.500 espectadores, batizado de Cine Niterói. Eram exibidos semanalmente filmes diferentes produzidos no Japão, para o entretenimento dos japoneses de São Paulo. A rua Galvão Bueno passa a ser o centro do bairro japonês, crescendo ao redor do Cine Niterói, tendo recebido parte dos comerciantes expulsos da rua Conde de Sarzedas (explicada no próximo subtítulo). Era ali que os japoneses podiam encontrar um cantinho do Japão e matar saudades da terra natal. Na sua época áurea, funcionavam na região os cines Niterói, Nippon (na rua Santa Luzia – atual sede da Associação Aichi Kenjin kai), Joia (na praça Carlos Gomes – hoje casa de shows) e Tokyo (rua São Joaquim – também igreja). Em abril de 1964 foi inaugurado o prédio da Associação Cultural Japonesa de São Paulo (Bunkyô) na esquina das ruas São Joaquim e rua Galvão Bueno.
A perseguição aos japoneses em São Paulo
Com o clima de hostilidade nos anos da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), os imigrantes japoneses no Brasil começaram a ser perseguidos como “espiões” infiltrados. Um aspecto particularmente violento desta perseguição foi a proibição de editar, fazer circular e ler qualquer livro, revista ou jornal escrito em japonês. O Estado Novo de Getúlio Vargas tornou os livros, a língua e a cultura japonesa inimigos da pátria, independentemente do que estava escrito.
Se é fato que a partir de 1937, com o Estado Novo, houve restrições em geral à utilização de línguas que não o português, a repressão foi mais dura e extensa no caso dos nipo-brasileiros. A leitura, os livros e os jornais tinham uma importância central naquele período para o grupo imigrante e sua proibição foi devastadora. Entre 1943 e 1945 houve várias investidas da polícia em casas nas redondezas da Rua Conde de Sarzedas, no bairro da Liberdade, e os nipo-brasileiros foram expulsos de suas casas para o interior. Em 23 de maio de 1943, a polícia confiscou livros e revistas na livraria japonesa Endo, depois também na Oriente, Toyoyoshi e Nambei. “Eles costumavam vir em grupo de quatro ou cinco e às vezes havia entre eles pessoas sem identificação. O objetivo da revista era verificar se havia armas clandestinas ou algum documento revelando que os moradores eram militares ou ocupavam cargos relacionados com o governo japonês”, conta o cronista e pintor Tomoo Handa em O imigrante japonês. História de sua vida no Brasil (T.A.Queiroz). A proibição do ensino da língua nas escolas e da circulação de livros e jornais em japonês quebrou a espinha dorsal da comunidade japonesa. No final da década de 1930, cerca de 30 mil filhos de imigrantes estudavam em 486 escolas da comunidade. Em 1939, 219 delas foram fechadas e em boa parte desses locais não havia escola pública próxima. No que se refere à imprensa, de 11.576 pessoas consultadas em uma pesquisa em 1939, um total de 87,72% eram assinantes de jornais em japonês.Era, portanto, por meio da língua nas escolas e nos livros e jornais que a comunidade mantinha seus laços culturais e preservava seu vínculo com o país de origem, mas, igualmente, estruturava sua permanência no Brasil, divulgando notícias locais, literatura produzida aqui, atividades de clubes e anúncios de lojas especializadas.A proibição da publicação de jornais impôs aos imigrantes um isolamento do Japão, mas igualmente do próprio Brasil, já que os jornais eram provavelmente o único meio de ter notícias locais. Isso levou os imigrantes a um profundo isolamento cultural e social e a uma forte pressão psicológica que propiciou a circulação de rumores sem qualquer veracidade envolvendo o Japão, o que se agravou com o fim da guerra, os ataques nucleares ao Japão e a rendição com o discurso do imperador. Não foi, assim, por pendor fanático ou fundamentalista que muitos imigrantes foram levados a desacreditar a derrota japonesa e alguns aderiram às armas.Foi uma resposta ao limbo cultural em que eles passaram a viver, sem informação e sem âncora segura de identidade na terra que escolheram para imigrar e viver – ao que se acrescentam valores e crenças como a ideia da infalibilidade do imperador e a descrença na possibilidade da derrota do país de origem. Perseguidos e abandonados em sua nova terra, colocados diante da escolha entre Brasil e Japão, os imigrantes e seus descendentes se viram em um contexto de intenso conflito de identidade – e foi neste terreno que eclodiu a violência e os terríveis assassinatos contra os chamados “derrotistas”. Isto não significa justificar a inaceitável violência dos chamados “vitoristas”, mas entender o contexto em que o conflito eclodiu.
A pergunta não é o que os “japoneses” faziam ou fizeram, mas entender de que forma um governo e seus milicianos do patriotismo construíram uma ideia de nacionalidade e nação baseadas na exclusão e na perseguição de um grupo, de sua cultura, seus livros e jornais. Os “japoneses” e os “amarelos” se tornaram inimigos menos por serem associados ao Japão e ao Eixo, contra o qual o Brasil estava em guerra desde 1942, e mais por uma concepção anti-japonesa de imigração que se disseminou desde os anos 1920. Este racismo incidia sobre um grupo que era, ao mesmo tempo, admirado por sua iniciativa no trabalho, na agricultura e no cooperativismo.Foi a partir desta violência contra o grupo nipo-brasileiro que se pode entender a história contada em “Corações Sujos”, que foca apenas no período 1946-1947 para contar um episódio de “fundamentalismo”.Os anos de 1939 a 1945 foram para os nipo-brasileiros um período trágico no qual a proibição e a perseguição contra a cultura japonesa e seus livros contribuiu para desestruturar socialmente um grupo que escolheu o Brasil para imigrar,viver, criar e imaginar um outro futuro para seus filhos, mantendo suas tradições e vínculos com o país de origem – o que lhe foi negado com violência pelo Estado brasileiro nos anos 1930 e 1940.
Origem dos nomes das principais ruas do bairro
Beco dos Aflitos
Lembra a existência do primeiro cemitério público aberto em São Paulo nos idos de 1848. A Capela dos Aflitos, onde é venerada Nossa Senhora dos Aflitos (daí o nome do beco), ocupava o centro do cemitério, conhecido como Cemitério dos Enforcados.
Rua dos Estudantes
Lembra a existência de antigas repúblicas de estudantes.
Rua Conselheiro Furtado
Homenagem a Francisco Maria de Souza Furtado de Mendonça, que nasceu em Luanda, na África, mas veio criança para o Brasil. Desde 1851, exercia o cargo de delegado de polícia. Morreu em 23 de maio de 1890.
Rua Galvão Bueno
Homenagem a Carlos Mariano Galvão Bueno nascido na cidade de São Paulo em janeiro de 1834. Formou-se em Direito em 1860. Morreu afogado em maio de 1883, quando pescava nas águas do Tamanduateí.
Rua da Glória
Local onde se localizava a chácara de Nossa Senhora da Glória. Em 1825, o presidente da Província, Lucas Antonio Monteiro de Barros, criou no local o Seminário das Educandas de Nossa Senhora da Glória.
Avenida Liberdade
Pela Lei nº 4.211, de março de 1952, passou a denominar-se Avenida Liberdade. Em 1822, chamava-se Rua da Pólvora.
Praça da Liberdade
Essa denominação, dada ao velho Largo da Forca, lembra a abolição da escravatura do Brasil, em maio de 1888. Em 1822,denominava-se “Campo da Forca”.
Rua Conde de Sarzedas
Homenagem a Bernardo José de Lorena, o Conde de Sarzedas, foi capitão-general de São Paulo de 5 de junho de 1788 a 27 de junho de 1797.Era fidalgo português.
Bibliografia
GUEDINE, André- Banco de Dados Folha de São Paulo, acervo online
PONCIANO, Levino (2001). Bairros paulistanos de A a Z (pp 124-125) São
Paulo, Editora Senac.
CYTRYNOWICS, Roney (21/09/2012). A repressão aos imigrantes e livros
japoneses durante a Segunda Guerra Mundial. Artigo para o portal Publish
News, na coluna Volta ao Mundo em 80 livros.
Portal Nippo-Brasil Online (18 de novembro de 1999). Matéria Crueldade marca
o início do bairro da Liberdade.

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